Uma homenagem aos posts com títulos pomposos e sem conteúdo algum*
Somos pessoas naturalmente egoístas. Nossas relações interpessoais são baseadas no escambo, seguindo um preceito bíblico: “é dando que se recebe”. Sobre isso falo em outra hora, comecei citando isso como desculpa pra escrever um post cretino, já que não consigo pensar em nada melhor.
Certa tarde, indo ao centro de Porto Alegre, entra uma mulher no trem. Não uma mulher qualquer, uma velha conhecida de viagens entediantes. Ela chega e conta a mesma história triste. Ela tem um filho que tem intolerância a lactose, e para que ela possa amamenta-lo é necessário um leite especial, que custa BEM caro. Até aí nada de anormal. As pessoas que utilizam o metrô com freqüência já devem ter ouvido essa história algumas vezes.... a novidade é que ela acrescentou que o governo estadual e federal não fornecem esse leite, e que é necessário entrar com uma ação na justiça. Normalmente um ou dois passageiros compravam os fatídicos adesivos que ela vende nessas viagens. O que me espantou é que não foram dois, mas várias pessoas que resolveram comprar. É espantoso como algum treino na arte da retórica possa fazer tanta diferença no lucro que ela teve. Até mesmo eu, que nem coração tenho, fiquei sensibilizado.
Não é de hoje que a assistência de nosso governo é quase nulo quando se trata de medicamentos caros e/ou especiais. Não são raros os casos em que alguma família entra com uma ação na justiça para ter o direito de receber esses medicamentos sem custo. Para se ter uma idéia, o leite que ela precisa, em um mês, ultrapassa os R$700,00. Quem, de meus amados leitores, puder pagar essa quantia deixe seu telefone que eu passo para a senhora necessitada. Essa lacuna me leva mais longe. Leva-me, de alguma forma, ao poder do tráfico que nos aterroriza. Não vou defender o tráfico ou os traficantes, mas na favela, longe dos cuidados do governo, e com a indiferença da nossa sociedade, abre-se espaço pra um poder paralelo. Mesmo que a assistência dada pelos traficantes tenha como preço a conivência com atividades criminosas, essa é a única ajuda que pessoas como a moça que abriu meu post tem.
Então eu pergunto quem é vítima e quem é criminoso nessa história? O consenso é de que as pessoas que moram na favela são tão criminosas quanto aos próprios traficantes (a não ser quando alguém quer aparentar sapiência e diz que na favela moram pessoas “decentes”). Essas pessoas foram condenadas a serem relegadas a segundo plano por uma sociedade hipócrita e ciosa de seus privilégios. Foram relegados a sobreviverem sozinhos, sem qualquer tipo de assistência, e quando a encontram, mesmo que a um preço alto, as condenamos e as chamamos de “vagabundas” ao não trabalharem, mesmo que as oportunidades de emprego nunca as tenham sido dadas. Quem é o culpado por situações com a da moça do leite sem lactose?
Ah sim, quase esqueço de dizer, eu não comprei os adesivos. Ela pode ser boa em retórica, mas ta longe de conseguir me convencer.
*porque nem mesmo eu escapo de alguns comentários ácidos.
Somos pessoas naturalmente egoístas. Nossas relações interpessoais são baseadas no escambo, seguindo um preceito bíblico: “é dando que se recebe”. Sobre isso falo em outra hora, comecei citando isso como desculpa pra escrever um post cretino, já que não consigo pensar em nada melhor.
Certa tarde, indo ao centro de Porto Alegre, entra uma mulher no trem. Não uma mulher qualquer, uma velha conhecida de viagens entediantes. Ela chega e conta a mesma história triste. Ela tem um filho que tem intolerância a lactose, e para que ela possa amamenta-lo é necessário um leite especial, que custa BEM caro. Até aí nada de anormal. As pessoas que utilizam o metrô com freqüência já devem ter ouvido essa história algumas vezes.... a novidade é que ela acrescentou que o governo estadual e federal não fornecem esse leite, e que é necessário entrar com uma ação na justiça. Normalmente um ou dois passageiros compravam os fatídicos adesivos que ela vende nessas viagens. O que me espantou é que não foram dois, mas várias pessoas que resolveram comprar. É espantoso como algum treino na arte da retórica possa fazer tanta diferença no lucro que ela teve. Até mesmo eu, que nem coração tenho, fiquei sensibilizado.
Não é de hoje que a assistência de nosso governo é quase nulo quando se trata de medicamentos caros e/ou especiais. Não são raros os casos em que alguma família entra com uma ação na justiça para ter o direito de receber esses medicamentos sem custo. Para se ter uma idéia, o leite que ela precisa, em um mês, ultrapassa os R$700,00. Quem, de meus amados leitores, puder pagar essa quantia deixe seu telefone que eu passo para a senhora necessitada. Essa lacuna me leva mais longe. Leva-me, de alguma forma, ao poder do tráfico que nos aterroriza. Não vou defender o tráfico ou os traficantes, mas na favela, longe dos cuidados do governo, e com a indiferença da nossa sociedade, abre-se espaço pra um poder paralelo. Mesmo que a assistência dada pelos traficantes tenha como preço a conivência com atividades criminosas, essa é a única ajuda que pessoas como a moça que abriu meu post tem.
Então eu pergunto quem é vítima e quem é criminoso nessa história? O consenso é de que as pessoas que moram na favela são tão criminosas quanto aos próprios traficantes (a não ser quando alguém quer aparentar sapiência e diz que na favela moram pessoas “decentes”). Essas pessoas foram condenadas a serem relegadas a segundo plano por uma sociedade hipócrita e ciosa de seus privilégios. Foram relegados a sobreviverem sozinhos, sem qualquer tipo de assistência, e quando a encontram, mesmo que a um preço alto, as condenamos e as chamamos de “vagabundas” ao não trabalharem, mesmo que as oportunidades de emprego nunca as tenham sido dadas. Quem é o culpado por situações com a da moça do leite sem lactose?
Ah sim, quase esqueço de dizer, eu não comprei os adesivos. Ela pode ser boa em retórica, mas ta longe de conseguir me convencer.
*porque nem mesmo eu escapo de alguns comentários ácidos.
3 Comments:
A pergunta também é académica, meu bem!
Toda a gente sabe que a culpa maior é do sistema que dá azo a situações incríveis como essa, não é?
Bom fim de semana!
Falar que a culpa do sistema é fácil. Frase tipicamente usada por quem não compreende que é parte do próprio sistema e que joga tão sujo quanto ele. Aliás, jogando sujo, faz com que o sistema jogue também. Fato. Se eu sou bonzinho? Não. Amo comprar, amo ter, amo comprar tênis e estudar nas melhores escolas enquanto tem gente que morre de fome. E a culpa é minha? Também. O fato é que, das nossas ações diárias resulta um complexo de situações ao qual denominamos sistema e este sistema infelizmente é injusto para os que nele vivem. O governo não dá base à população, apenas paliativos, fazendo com que o pobre queira ser cada vez mais pobre. O governo permite o tráfico, ao descuidar de prerrogativas básicas como educação e saúde. Fala batida? Sim. E quem permite ao governo que ele faça isso? Nós. Simples. Eu acho é que estamos tomando gosto pela coisa, e nossa vontade de mudar este país não é mais que um jargão barato de telenovela.
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Vítima ou não vítima, acho que tudo isso é muito relativo.
Sem mais, cito meu amor:
Porque não existem fatos. Tão somente, interpretações...
Friedrish Nietzsche.
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